A história da administração pública no Brasil teve
início com o patriarcalismo colonial, que evoluiu para o coronelismo da República.
Mas a partir do momento em que chefes políticos foram perdendo a capacidade de
controlar os votos, passaram a utilizar a formulação de políticas públicas como
meios legais de controle de clientela. [1] A
troca política, portanto, enraizou-se entre a “ordem humana e a aspiração ao
poder”.[2]
É certo que as políticas públicas refletem o contexto
sócio-político-econômico do país, Estados e seus Municípios, seguem ditames da
Carta Magna, da legislação infraconstitucional, da legislação fiscal, são
implementadas por agentes políticos e servidores públicos, sofrem influências
do segundo e do terceiro setor.
Mas também se originam nas ideologias e interesses
dos partidos políticos poderosos, que por vezes, definem a formulação de políticas
públicas de modo a fidelizar o voto do eleitor e perpetuar sua manutenção no
poder político. Esta é a dimensão da máquina política, colocada em movimento
num sistema de recompensas. Neste contexto, a administração pública contaminada
pelo clientelismo pode assumir versão tradicional, “caracterizado por um forte
conteúdo personalista” de trocas privadas ou ser direcionado ao atendimento de
demandas difusas de determinado eleitorado, mobilizado por motivações
ideológicas, econômicas e/ou regionais.[3]
A questão se aprofunda na análise sóciodemográfica de
redutos eleitorais. Em locais mais carentes, eleitores tendem a preferir
benefícios individualizados às suas necessidades prementes. Já em locais mais abastados,
eleitores ficam satisfeitos com bens públicos universalistas, como calçamentos,
infraestrutura, pois a renda pessoal que lhes garante a satisfação de
necessidades básicas[4].
O binômio necessidade-oportunidade parece lógico
deste ponto de vista, mas trata-se de uma análise parcial do cenário de trocas
político-eleitorais descortinado no Brasil. O que se observa não é apenas o
clientelismo eleitoral, como se pensava, mas sim, a utilização de grandes
grupos corporativos para custear campanhas e mandatos em troca de
favorecimentos empresariais.
Temos hoje, no Brasil, discussão aberta sobre
corrupção. E cada nova situação descrita, que traz a público métodos requintados
e complexos de corrupção, novas regras legais são criadas para limitar as
trocas eleitorais, senão pela legislação, mas pelo próprio Poder Judiciário. Estas
regras, contudo, contribuirão para coibir a corrupção, mas não eliminá-la.
O espanto da nação é justificado e se dá em razão da
audácia nas cifras e do aspecto corriqueiro da corrupção político-empresarial. Mas
a cura deste mal está no voto, instrumento da democracia. O espanto é
importante, a indignação é medicinal, mas o futuro é escolha do cidadão. No
momento do voto, que se aproxima, é importante repensar partidos e candidatos,
analisar o passado para repaginar o futuro, pois “o erro acontece de vários
modos, enquanto ser correto é possível apenas de um modo”.[5]
[1] FERNANDES, W. A força do clientelismo. João Pessoa:
Universitária, 2006.222p.
[2] BAHIA,
L. H. N. O poder do clientelismo:
raízes e fundamentos da troca política. Rio de Janeiro: 2003.374p.
[3] DINIZ, E. Voto e máquina política: patronagem e
clientelismo no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.228p.
[5] ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco. Tradução: Edson Bini. São Paulo: Edipro.
2002.287p.